Caso o texto da PEC 32 seja promulgado, os servidores serão atingidos em diversos pontos aponta consultor do Senado.
Carlos Vítolo
Imprensa Sindcop
Enviada ao Congresso Nacional pelo governo federal no ano passado, a reforma administrativa propõe uma série de alterações nas regras do serviço público.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/20 modifica a organização da administração pública direta e indireta, tanto da União, quanto dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.
A PEC da reforma administrativa propõe medidas que envolvem a contratação, remuneração, desligamento de pessoal e acaba com a estabilidade de futuros servidores.
No entanto, a reforma administrativa não atinge apenas os futuros servidores públicos, mas também os atuais. É o que aponta um estudo que analisa os efeitos diretos da reforma administrativa sobre os atuais servidores públicos, feito pelo consultor legislativo do Senado, o advogado Luciano Henrique da Silva Oliveira.
Segundo o especialista, ao examinar tecnicamente o texto da reforma administrativa, nota-se “que as regras de transição da PEC nº 32, de 2020, não são suficientes para preservar os servidores de hoje da incidência do novo regime” e caso seja promulgado, os servidores serão atingidos em diversos pontos.
O documento aponta que especialistas têm comentado que a reforma poderá deteriorar a estrutura do serviço público e enfraquecer a meritocracia, a estabilidade e a segurança jurídica, especialmente dos servidores efetivos, tudo sem gerar efetivamente economia para o erário. “Mesmo que as novas regras se apliquem apenas aos futuros agentes, elas indiretamente afetarão também os atuais servidores, caso as mudanças venham realmente a degenerar o serviço público como um todo”.
O advogado explica que, para preservar os agentes administrativos de hoje dos efeitos das novas regras da reforma administrativa, é necessário que as regras de transição nela veiculadas, hoje constante dos arts. 2º a 9º da PEC, realizem efetivamente essa proteção. No entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), de que não existe direito adquirido dos servidores ao regime jurídico vigente, se as regras de transição não ressalvarem expressamente a aplicação das normas futuras, os servidores do presente poderão ser alcançados pelas novas disposições.
O estudo destaca que o art. 2º da reforma administrativa prevê que será garantido um regime jurídico específico aos servidores públicos atuais, no entanto, não esclarece em que consistirá exatamente esse regime específico.
Enquanto isso, assegura aos atuais servidores a não aplicação das alíneas “a” a “j” do novo inciso XXIII do art. 37 da Constituição Federal, caso haja lei específica vigente em 1º/09/2020 (data de apresentação da PEC) que tenha concedido os benefícios nelas previstos, exceto se houver alteração ou revogação da referida lei.
“Essas novas alíneas vedarão, entre outros benefícios, férias superiores a trinta dias por ano, adicional por tempo de serviço, licença-prêmio, redução de jornada sem a correspondente redução de remuneração, aposentadoria compulsória como forma de punição, promoção por tempo de serviço e parcelas indenizatórias sem previsão em lei”, descreve o estudo do consultor do Senado.
Segundo o advogado, o inciso III do artigo é um dos dispositivos mais problemáticos da PEC, com uma redação “bastante nebulosa” e prevê que aos servidores públicos atuais serão assegurados os demais direitos previstos na Constituição. “Afinal, que demais direitos são esses? Seriam os atualmente previstos, isto é, os anteriores à entrada em vigor da Reforma Administrativa, ou aqueles que ela inserirá na Lei Maior para os futuros servidores?”
O estudo também faz referência às regras de perda do cargo por servidor público estável. Luciano Oliveira aponta que hoje a Carta Magna prevê que o servidor estável somente perderá o cargo em razão de sentença judicial transitada em julgado, de processo administrativo ou de avaliação periódica de desempenho. No entanto, ele relata que “as novas regras propostas dispõem que o servidor estável poderá perder o cargo por meio de decisão judicial transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, de processo administrativo ou de avaliação periódica de desempenho”. E questiona: “Poderão os atuais servidores estáveis perder futuramente o cargo por decisão judicial colegiada não transitada em julgado? Ou por avaliação de desempenho prevista em lei ordinária, e não complementar?”
O art. 5º é outro ponto problemático da reforma para o especialista. Para ele, “o dispositivo busca preservar as regras atuais de acumulação de cargos e empregos públicos para os presentes servidores, a fim de que eles não sofram a incidência das novas regras de acumulação previstas pela PEC.”
De acordo com o estudo, na forma como está, a regra de transição garante a acumulação nos moldes atuais apenas para os servidores que já exercem dois cargos públicos. O especialista destaca que há dois problemas. “O primeiro – mais evidente – é que a regra prejudicará os atuais servidores que não exercem dois cargos públicos, mas que hoje tem a possibilidade de fazê-lo, que ficarão de fora da regra de transição sobre acumulação. O segundo – mais sutil, mas não menos relevante – é que, mantida a atual redação do art. 5º, haverá dúvida sobre qual regra de acumulação de cargos será aplicável aos atuais servidores que ainda não acumulam dois cargos.”
Ele aponta que a PEC da reforma administrativa cria duas regras diferentes para os futuros cargos típicos de Estado, que só poderão acumular o cargo de docência ou atividade própria de profissional da saúde. Enquanto isso, os demais servidores poderão acumular seu cargo com qualquer outro, desde que não haja conflito de interesses. “Na prática, poderá surgir a intepretação de que os servidores atuais ficarão sem autorização constitucional para a acumulação de cargos, ficando, com isso, mais prejudicados até do que os futuros servidores”, destaca.
Para solucionar a falha, o especialista sugere que é fundamental alterar a redação do caput do art. 5º da PEC nº 32, e que deveria constar o seguinte texto: “Ao servidor público investido em cargo efetivo ou emprego permanente até a data da entrada em vigor desta Emenda Constitucional é admitida a acumulação remunerada de cargos ou empregos públicos, se houver compatibilidade de horários e observado em qualquer caso o disposto art. 37, caput, inciso XI, da Constituição, nos seguintes casos: (…)”. Com isso, ele aponta que a regra de transição será estendida a todos os atuais servidores.
Ao concluir o estudo, o advogado Luciano Oliveira afirma que, há vários dispositivos da PEC nº 32 que, na atual redação, podem acabar afetando diretamente os atuais servidores públicos. Por fim, ele apresenta um quadro comparativo com as modificações propostas em seu estudo. Confira abaixo.


