No Estado de São Paulo, a onda privatista quer atingir o sistema prisional
Carlos Vítolo
Da Redação – SINDCOP
A propriedade pública é um caminho para assegurar a prestação de serviços públicos, garantir ganhos sociais, promover a inclusão e assegurar políticas públicas aos cidadãos de forma eficaz, eficiente, efetiva e, sobretudo, democrática. É o que aponta o prefácio do estudo “O Futuro é Público: pela Propriedade Democrática dos Serviços Públicos”, elaborado por pesquisadores reunidos pelo Transnational Institute.
A partir do estudo, o Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas lançou nesta segunda-feira (13), durante uma audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH), no Senado Federal, a edição impressa do livro “O Futuro é Público”. Segundo o Comitê, a obra reúne informações de mais de 1.400 casos bem-sucedidos de remunicipalização em mais de 2.400 cidades de 58 países ao redor do mundo. O Comitê também lançou a campanha “Se é público é para todos”.
Durante a audiência, os participantes defenderam o combate à privatização de estatais e o aumento de ações em defesa do patrimônio público brasileiro. Segundo o Senado, o movimento surgiu durante a tramitação do Projeto de Lei do Senado (PLS) 555/2015, chamado de Estatuto das Estatais ou Lei de Responsabilidade das Estatais. A proposta foi aprovada pelo Congresso e sancionada em 2016 como Lei 13.303.
Para o senador Paulo Paim (PT-RS), que foi quem apresentou o requerimento para o evento, tanto o lançamento da campanha quanto a publicação do livro, vêm em boa hora e que, sem a luta dos servidores públicos e de parlamentares comprometidos com o bem público, outras propostas nessa linha, como a reforma Administrativa (PEC 32/2020), já teriam sido aprovadas.
“É hora de reafirmar que a gestão pública tem compromisso com a coletividade; olhar para o futuro e não só para o presente. A gestão pública democrática e transparente é o caminho eficaz para induzir um crescimento econômico sustentável e reduzir desigualdades”, disse.
A obra destaca que, em todo o mundo, cidades e comunidades locais têm retomado serviços públicos ou os reinventado para atender às necessidades da população. “Apesar dos crescentes desafios e revoltas sociais, as ideias neoliberais ainda dominam muitos governos nacionais e organizações internacionais, fazendo avançar uma agenda de privatização e austeridade e um regime comercial favorável às empresas transnacionais. Movimentos políticos de extrema-direita procuram aproveitar a insegurança e a raiva das pessoas e estão usando o racismo e a xenofobia para nos dividir. As forças progressistas podem reagir apresentando alternativas baseadas na solidariedade e na cooperação, mas também oferecendo soluções concretas como empregos decentes, acesso a serviços públicos para todos e economias locais resilientes”, descreve.
O estudo aponta que a privatização dos serviços públicos está agora mais desacreditada do que nunca, mas que ela continua no topo da agenda das grandes empresas privadas e mercados financeiros, além de governos nacionais e instituições internacionais. “A privatização assume muitas formas e nomes disfarçados, incluindo parcerias público- privadas (PPPs), iniciativas financeiras privadas, terceirização, corporatização, “direito de escolha”, concorrência forçada e liberalização do mercado”.
De acordo com dados da pesquisa do Transnational Institute, de 2000 até 2019, ao menos 1.408 serviços foram reestatizados ou estatizados no mundo. “As reestatizações e criação de novas estatais, aconteceram com destaque em países centrais do capitalismo, como EUA e Alemanha. Isso ocorreu porque as empresas privadas priorizavam o lucro e os serviços estavam caros e ruins”.
Onda privatista assombra o sistema prisional
Em janeiro de 2019, o ex-governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou que iria privatizar os novos presídios construídos no Estado. Conforme Doria, o modelo a ser utilizado seria o de parcerias público-privadas (PPPs). Desde que Doria anunciou a intenção de privatizar o sistema prisional, o Sindcop se posicionou totalmente contrário à privatização das unidades prisionais.
No mesmo ano de 2019, o governo publicou o edital de licitação para duas unidades prisionais, visando a gestão compartilhada com a iniciativa privada. A Defensoria Pública e outras instituições propuseram uma ação para anular o edital e tiveram parecer favorável.
No entanto, no início deste mês, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), em sentença da 10ª Câmara de Direito Público, por unanimidade, decidiu que não existe ilegalidades na gestão compartilhada de duas unidades prisionais. Desta forma, manteve o edital lançado pela Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), com o objetivo de iniciar o processo de privatização dos dois Centros de Detenção Provisória (CDP) de Gália.
O Sindcop considerou tal decisão um retrocesso. “Esse acordão é um retrocesso para Justiça brasileira. Estamos indo na contramão do mundo, a primeira atitude do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi a reestatização das penitenciárias federais. É triste essa decisão. Vamos acreditar que no Supremo Tribunal Federal venceremos essa luta contra a saga da privatização dos presídios”, disse o diretor de Assuntos Jurídicos do Sindcop, Carlos Piotto.
No último dia 17, o presidente do SINDCOP, Gilson Pimentel Barreto, a convite da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, participou de um debate para tratar de uma proposta que analisa as atividades desenvolvidas pela iniciativa privada nas unidades prisionais. O tema do debate se baseou no Projeto de Lei 2694/2015, que altera a Lei de Execução Penal e disciplina as atividades desenvolvidas pela iniciativa privada nas unidades prisionais. A proposta foi elaborada pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou o sistema carcerário brasileiro.
Sobre o PL 2694/2015, Piotto destaca que “expressamente prevê terceirização das atividades internas dos presídios. Já havia parecer contrário do antigo relator a esse projeto, mas foi alterado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, que defende essa onda privatista”, disse o sindicalista. “Esse projeto é inconstitucional, pois é atividade da Polícia Penal”, finalizou o Diretor de Assuntos Jurídicos do Sindcop.