123 presídios de SP não têm laudo dos Bombeiros contra incêndio e funcionam irregularmente

Nas unidades prisionais de São Paulo, a ausência do Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) é regra, e não exceção. Situação põe em risco não só a vida de presos e servidores, mas de todas as pessoas envolvidas com o processo de execução penal

* Matéria atulizada às 8h34 de 30/10/2020 para incluir posicionamento do Corpo de Bombeiros

Por Lucas Mendes

Dos 177 presídios do Estado de São Paulo, apenas 27 estão em dia com o Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). O documento certifica as condições de segurança contra incêndios em estabelecimentos públicos e privados. 

Dados obtidos pelo SINDCOP via Lei de Acesso à Informação junto a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) detalham a preocupante situação dos presídios paulistas.

Em todo Estado existem 123 unidades prisionais sem AVCB e duas em que o documento está vencido (PII Feminina de Tremembé e CRF de São José dos Campos). O levantamento não traz informações sobre os hospitais de custódia da SAP (Franco da Rocha, Taubaté e o Centro Hospitalar do Sistema Penitenciário, em São Paulo).

Para outros 22 presídios o processo de renovação da vistoria está em diferentes etapas.

É o caso das penitenciárias de Lucélia e de Mirandópolis (I), onde o projeto técnico, documento prévio para obtenção do laudo, ainda não foi aprovado devido à “complexidade da estrutura da unidade”. 

Outro caso é o de duas unidades de Pacaembu, a Penitenciária e o Centro de Progressão Penitenciária (CPP), que aguardam desde 2016 a atualização do projeto técnico, pois os presídios passaram por obras que alteraram sua estrutura. 

As informações mais recentes sobre a Penitenciária de Irapuru e o Centro de Detenção Provisória (CDP) de Icém são de 2018. Na primeira o núcleo regional do Departamento de Engenharia da SAP aguarda há dois anos a documentação para seguir com o laudo. Em Icém a unidade aguardava o término de reformas com seks shop mão de obra dos presos para solicitar nova vistoria ao Corpo de Bombeiros. 

As justificativas acima são algumas das apresentadas pela SAP para as unidades prisionais que não possuem o AVCB ou que estão em fase de renovação – processo que em alguns casos está levando vários anos. 

Para o presidente do SINDCOP, Gilson Pimentel Barreto, a situação reflete o descaso com as pessoas envolvidas no processo de execução da pena.

“É uma questão de segurança para as pessoas que estão envolvidas com a unidade prisional. Nós já repassamos esse fato para órgãos que são ligados à execução penal e o próximo passo será acionar judicialmente a SAP, o Governo de São Paulo e até os Bombeiros”, ressalta.

Alarmante

O Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros certifica que, após a vistoria feita pela corporação, a edificação possui condições de segurança contra incêndio. 

Em São Paulo, o decreto 63.911, de 2018, instituiu o Regulamento de Segurança Contra Incêndios. Segundo o documento, caso os estabelecimentos não cumpram os dispositivos de segurança, é possível aplicação de advertências e multas, que podem chegar a mais de R$ 270 mil, dependendo da gravidade da infração (10.000 UFESP).

A situação da falta de laudos dos bombeiros nos presídios paulistas foi considerada “alarmante” por Marcelo Feller, vice-presidente da Comissão de Política Criminal e Penitenciária da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP). Para o advogado, o funcionamento irregular das unidades indica “possível aumento de risco à vida de pessoas privadas de liberdade e de agentes penitenciários em casos de incêndio”. 

Segundo Feller, o contexto também preocupa porque, em caso de incêndio nas unidades prisionais, não há uma rota de fuga, como ocorre em outros tipos de prédios públicos ou privados. “É necessário que existam planos de emergência claros e previamente estruturados”, pontua.

Para Leonardo Biagioni de Lima, defensor público e coordenador-auxiliar do Núcleo Especializado de Situação Carcerária (NESC) da Defensoria Pública de São Paulo, a ausência do AVCB põe em risco a segurança das pessoas que circulam pelas unidades prisionais, como visitantes de pessoas presas, juízes, oficiais de justiça, defensores públicos, advogados e promotores, além dos próprios presos e servidores penitenciários.

“Infelizmente, como mostram os dados, a regra é não haver esses laudos”, enfatiza o defensor. “Os motivos dados pelas direções das unidades prisionais são vários: ausência de solicitação ao corpo de bombeiros, não realização de projeto técnico para avaliação por falta de dinheiro, projeto em andamento, aguardando avaliação do corpo de bombeiros, necessidade de regularizar situações verificadas pelo corpo de bombeiros”.

Segundo Biagioni, quando a inspeção dos defensores constata ausência do documento o NESC requisita a elaboração e o acompanhamento do projeto, seja por meio de ofício à unidade prisional ou por meio de pedido de providências via corregedoria dos presídios.

O que diz o Governo

O SINDCOP questionou, via email, a SAP e a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo para apurar a responsabilidade e obter uma justificativa dos órgãos sobre os fatos da reportagem.

Em nota, o Corpo de Bombeiros afirmou que “analisa os projetos enviados pela Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) para obtenção de Autos de Vistoria do Corpo de Bombeiros”.

Até a publicação da matéria a SAP não enviou nenhuma resposta. O texto poderá ser atualizado, caso a secretaria se manifeste.

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