Ministros da Justiça participam de conferência sobre desafios causados pela Covid-19 no sistema penitenciário

Conferência reuniu as autoridades dos países Ibero-Americanos e focou nas medidas adotadas. Na semana passada, o ministro Moro disse que não existe motivo para temor no sistema penitenciário. SINDCOP discorda do ponto de vista do ministro, nas últimas semanas o sindicato recebeu denúncias sobre a falta de materiais de prevenção nas unidades prisionais.

Carlos Vítolo

Ministros da Justiça dos Países Ibero-Americanos participaram de uma conferência virtual, que discutiu os desafios do sistema penitenciário no contexto da pandemia da Covid-19, provocada pelo novo coronavírus. Participaram do evento autoridades de 26 países.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, foi representando pelo diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Fabiano Bordignon, por integrantes da Assessoria Especial Internacional e por assessores especiais do ministro.

O objetivo do encontro foi gerar reflexão, cooperação e diálogo, com a participação de especialistas, para fazer frente aos desafios comuns causados pela pandemia da Covid-19. Segundo o Ministério da Justiça, o debate se concentrou nas medidas adotadas nos diversos sistemas penitenciários, por serem considerados, segundo especialistas, locais de grande exposição para o avanço da pandemia. A iniciativa foi do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o evento ocorreu na última sexta-feira (3).

De acordo com o MJ, em sua intervenção, o diretor-geral do Depen afirmou que não há casos confirmados nos mais de 1.400 estabelecimentos prisionais do país, até o momento. Falou ainda sobre a medida de suspensão de visitas e a prática adotada para a confecção de máscaras de proteção nas unidades prisionais.

Não existe motivo para temor no sistema penitenciário?

Na semana passada, o ministro Moro disse que o sistema prisional do país não tem problemas em relação à disseminação da Covid-19. “Há ambiente de relativa segurança para o sistema prisional em relação ao coronavírus, pela própria condição dos presos de estarem isolados”, declarou durante coletiva no Palácio do Planalto.

O ministro destacou que o Brasil tem atualmente 752 mil presos e 83 mil servidores no sistema prisional. “Não existe nenhum motivo para um temor infundado no sistema penitenciário”, afirmou. Disse ainda que o governo está recomendando o “aumento de algumas regalias”, com a ampliação do tempo de banho de sol.

No Estado de São Paulo, foi necessário uma liminar, onde a Justiça proibiu a visita aos presos das 176 unidades prisionais. A intenção da decisão foi conter a proliferação do novo coronavírus entre policiais penais, demais servidores, presos e visitantes.

SINDCOP discorda do ponto de vista de Moro

Sobre a posição do ministro, de que “há ambiente de relativa segurança” e de que “não existe nenhum motivo para um temor”, o presidente do SINDCOP, Gilson Pimentel Barreto, disse que discorda do ponto de vista do ministro.

“Da parte de um dos sindicatos que representa o sistema prisional do Estado de São Paulo, existe sim uma certa preocupação. Desde antes de a Secretaria da Administração Penitenciária adotar medidas, o sindicato [SINDCOP] já havia se antecipado, oficiando e inclusive tendo que ingressar com ações judiciais para restringir a mobilização dos sentenciados”, ponderou o presidente.

“A nossa preocupação ainda se torna maior no sentido que, nem todas as unidades possuem equipamentos de proteção individual em quantidade suficiente para utilização e até individualização dos equipamentos. Temos conhecimento de que, em algumas unidades, os servidores estão compartilhando determinados equipamentos, ou seja, não é exclusivo de um único servidor”, argumenta Barreto.

O sindicalista aponta ainda que o sistema penitenciário de São Paulo é totalmente precário de equipes de saúde. “Chegamos ao descalabro de plantões noturnos não terem nem auxiliares de enfermagem nas unidades. As equipes de enfermagem no sistema penitenciário de São Paulo são muito aquém do desejado. Não existe enfermeiros, médicos, auxiliares de enfermagem e dentistas suficientes, principalmente para o atual momento”, disse.

Além do momento atual da grave pandemia da Covid-19, há anos outra questão preocupa o sistema prisional, a superlotação das unidades prisionais. Para o presidente do SINDCOP, “essa questão torna difícil promover isolamento de casos suspeitos e de casos que vão se agravando, que é o que nós temos visto. Isso sem dizer que no estágio mais severo da doença, esses presos vão ter que ir para a rede pública, ou seja, vão ter que sair das unidades e serem alocados em algum hospital preparado”, explicou.

Outro ponto destacado pelo presidente do SINDCOP e que o leva a discordar do ponto de vista do ministro Moro, é a questão das transferências de presos entre unidades prisionais. “Embora todo esforço, toda solicitação feita de minimizar as transferências do sistema penitenciário, continuamos tendo notícias de transferências de números elevados de presos. Isso contraria o que nos foi passado pelo secretário [Nivaldo Restivo] de que a movimentação seria necessária por questões de prisão em flagrante e de conflitos entre presos, além de casos de insubordinação disciplinar”, argumentou Barreto.  Ainda de acordo com o presidente, o sindicato não tem tido conhecimento dessas ocorrências e mesmo assim muitas transferências estão acontecendo. “Fica difícil concordar com o ministro quando ele diz da relativa tranquilidade”, finalizou o presidente.

SINDCOP tem recebido denúncias dos servidores

Nas duas últimas semanas, o SINDCOP recebeu uma série denúncias sobre a falta de materiais e de ações por parte do governo estadual, para o enfrentamento da pandemia do Covid-19 nas unidades prisionais.

Por meio áudios e mensagens enviadas por aplicativo para celular, servidores demonstraram a insatisfação com a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).

Antes mesmo das reclamações, o SINDCOP já havia protocolado, no mês passado, um ofício na SAP (Secretaria da Administração Penitenciária), cobrando ações do órgão para a prevenção do contágio da Covid-19 nas unidades prisionais. No documento, o sindicato também cobrou o afastamento imediato das servidoras grávidas, portadores de doenças graves e de grupos de risco, além do fornecimento de materiais de proteção, como luvas, máscaras e álcool gel.

Em nota, divulgada pela instituição no último dia 30, o sindicato cobrou ações de desinfecção e higienização nas unidades prisionais. “Em atenção a todos os servidores do sistema penitenciário, e em virtude ao descaso do governo, no sentido da falta de prevenção de materiais de proteção e combate à pandemia, o SINDCOP vem a público para repudiar a irresponsável atitude do governo de São Paulo e, ao mesmo tempo, cobrar ações concretas da SAP, para a segurança dos funcionários de todas as unidades prisionais”, descreve a nota.

Para se evitar o risco de circulação do novo coronavírus, e garantir a segurança de todos, o SINDCOP ingressou na Justiça com ações visando a suspensão das transferências de presos, no entanto, o pedido de liminar dos mandados de segurança foi indeferido no último dia 25. O sindicato justificou que a movimentação de presos entre diversas unidades prisionais coloca em risco o resultado dos esforços desenvolvidos pelas autoridades para se evitar a circulação do novo coronavírus, no entanto, o pedido foi negado.

Não satisfeito, o sindicato também ingressou com uma ação civil pública, com pedido coletivo e liminar de urgência, para suspender de imediato todas as transferências de presos das unidades administradas pela SAP, durante a pandemia do novo coronavírus. Até o momento, o sindicato ainda não obteve parecer. Segundo a ação, caso a tutela não seja concedida, poderá motivar o aceleramento da contaminação pela Covid-19, tanto de presos, quanto de servidores e familiares, o que tornaria impossível o controle da pandemia.

Servidores podem colaborar fazendo denúncias ao SINDCOP

O SINDCOP está acompanhando de perto a grave pandemia do novo coronavírus e solicita a todos os servidores das unidades prisionais, que enviem informações diárias sobre a situação, para que o sindicato possa produzir boletins, atualizar e orientar a todos, além de cobrar o governo. Os dados podem ser enviados por meio do aplicativo WhatsApp (14) 99762-7130 / (14) 99842-5509.