Sem reconhecer responsabilidades do poder público, Itamarat
Sem reconhecer responsabilidades do poder público, Itamaraty classifica de “tendencioso” e “desinformado” o conteúdo de comunicado emitido em conjunto por duas entidades de direitos humanos da ONU
Contingente policial que reprimiu os manifestantes em Brasília contou também com apoio da Força Nacional de Segurança. Foto: Inês Ferreira.
Fonte: Rede Brasil Atual
Comunicados da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgados na sexta-feira (26) condenaram o “uso excessivo da força” contra os manifestantes do ato #OcupaBrasília, na quarta-feira (25). Em documento, assinado pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) e pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH, a entidade manifesta preocupação com a operação promovida pelo prefeito João Doria (PSDB) e pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), na chamada cracolândia, na região central da cidade de São Paulo, além de criticar a violência policial em conflitos de terra no campo, citando o recente massacre de 10 agricultores por policiais,em Pau D\\\’Arco, no Pará.
“Instamos o Estado brasileiro a redobrar seus esforços para promover o diálogo e proteger o direito à manifestação pacífica”, afirmou Amerigo Incalcaterra, representante da ACNUDH. Os organismos também pediram que manifestantes possam exercer seu direito à livre manifestação de forma pacífica.
No entendimento das entidades, o poder público brasileiro erra também na avaliação de riscos à lei e à ordem, razão pela qual também é criticado o uso de armas de fogo durante as manifestações. A nota ressalta que tais armamentos não devem ser utilizados “exceto naquelas ocasiões em que as instituições policiais não possam reduzir ou deter com meios menos letais àqueles que ameaçam a vida e integridade de outras pessoas”.
A ONU também alerta sobre a violência da operação de desocupação da Cracolândia, em São Paulo: “várias pessoas ficaram feridas (…) durante uma operação de segurança para remover das ruas dependentes químicos usuários de drogas ilícitas”, indicou.
A ONU quer também uma investigação sobre a morte de dez pessoas durante o despejo violento realizado pelas Polícias Civil e Militar paraenses em uma fazenda daquele estado.
As entidades convocam o Estado brasileiro a “garantir e proteger a integridade física e a segurança dos e das manifestantes”. “Chamamos as autoridades brasileiras a garantir o pleno exercício dos direitos humanos no marco de um Estado democrático de Direito, o qual é condição fundamental para a promoção e proteção efetiva dos direitos humanos no país”.
O comunicado foi emitido dois dias depois da violenta repressão comandada por Michel Temer durante a mobilização que levou cerca de duzentas mil pessoas a Brasília, segundo os organizadores, para protestar contra as reformas promovidas trabalhista e Previdenciária, pela renúncia do presidente e realizações de eleições diretas para a sucessão. Na quinta-feira (25), a convocação das Forças Armadas contra a população foi objeto de denúncia encaminhada à ONU pelas deputadas Maria do Rosário (PT-RS), Luiza Erundina (Psol-SP) e Paulão (PT-AL).
“Durante as manifestações, ocorreram atos de violência, incluindo o incêndio e a depredação de equipamentos públicos”, apontou a entidade, que lembrou que sete pessoas foram detidas e 49 ficaram feridas, algumas delas gravemente e uma delas com arma de fogo. “Do mesmo modo, reportou-se que a Polícia Militar utilizou gases pimenta, lacrimogêneo e balas de borracha para reprimir os protestos.”
Descontente
Ainda noite de sexta, o Ministério das Relações Exteriores reagiu à crítica dos órgãos internacionais de direitos humanos sobre os episódios de Brasília, Pará e São Paulo. Por meio de nota à imprensa, o Itamaraty classificou de “tendencioso” e “desinformado” o conteúdo do comunicado emitido pela ACNUDH e pela CIDH. De acordo com o governo Temer, as críticas afastam-se de princípios como o “respeito à verdade dos fatos”.
“Em momento algum os autores da nota se preocuparam com a ameaça à segurança de funcionários públicos e de manifestantes pacíficos sujeitos à violência sistemática e claramente premeditada”, diz a nota. O governo brasileiro alega que agiu para garantir a “integridade física de milhares de funcionários públicos” e dos próprios manifestantes.
O Itamaraty também classificou de “atitude que beira a má-fé” a menção da nota à operação que culminou com a morte de 10 trabalhadores rurais no município de Pau d’Arco (PA). Segundo o governo, o conflito agrário “já está sendo apurado” pelas autoridades competentes.
Sobre a ação na Cracolândia, o Ministério das Relações Exteriores acusou as entidades de capitalizarem o episódio de forma cínica e “fora de contexto”, com “fins políticos inconfessáveis”. “O combate ao tráfico de drogas, bem como o apoio a dependentes químicos, enseja atuação da máxima seriedade, que é a marca das reconhecidas políticas públicas brasileiras no enfrentamento ao problema mundial das drogas”, diz a nota emitida pelo governo brasileiro.
Por fim, o Itamaraty afirma que o país toma atitudes com base na Constituição Federal e seguindo os princípios internacionais de proteção aos direitos humanos e desqualifica a atuação das entidades das Nações Unidas. “É surpreendente e condenável que nota subjetiva e distante da realidade sacrifique o compromisso de seriedade e imparcialidade de organismos internacionais cuja ação o Brasil apoia e promove”